E quando aqueles que deveriam combater injustiças se tornam algozes? Cometendo também injustiças, dilacerando opositores, calando vozes dissonantes, tipo polícia política. Atam nossas mãos, amordaçam nossas bocas, acorrentam nossos pés, sempre sob o manto da discrição, do gesto dissimulado, do jeitinho, com um sorrisinho no rosto e se bobear até com um tapinha no ombro.
E quando aqueles que deveriam combater injustiças te abraçam em um dia e te apunhalam no outro? E o fazem pelas costas, sem direito a defesa, com uma lâmina fina, discreta? Te penduram de ponta cabeça, te deixam sangrar, pouco a pouco, vagarosamente, até que você não aguente mais, para que assim você, você mesmo, o apunhalado, o injustiçado pelos justiceiros, peça arrego, suplique pelo fim, pelo sumiço, pelo adeus.
E quando aqueles que se dizem porta-vozes dos oprimidos, que prometem e que deveriam combater injustiças, não mais combatem injustiças, mas apenas fingem combater injustiças? Aqueles mesmos que no início as combatiam, mas que com o tempo, com a velhice do espírito, com o fim da utopia da juventude e com a degeneração daquilo que lhes era referência, desistem de combater injustiças para serem eles mesmos, no meio do seu rebanho, do seu proletariado, seus disseminadores?! E o pior: dizendo combater injustiças!
Que faremos?! Que fazemos?!
Não há resposta fácil, ainda que só exista uma: rebelarmo-nos.
Sim, rebelarmo-nos. Em nome da justiça e de todas e todos que sofreram e que sofrem nas mãos dos neoalgozes, estes que em uma mão seguram flores de plástico e na outra o chicote que estrala.
Rebelarmo-nos para pôr um basta a tanta arbitrariedade naquele que deveria ser o Palácio da Moral, porque, afinal, gente não é gado, tampouco nós, que também somos gente, e que conhecemos o caminho da rebelião, suas nuances e contratempos, suas armadilhas e oportunidades.
E que almejamos, ao nos rebelarmos, não o sangue da vingança nem as dores do conflito, mas o oásis do que é certo. A guerra para chegar à paz, a insurreição em busca da virtude, a revolta por uma vida harmoniosa.
Ardência e luta se misturam. Cansamos, choramos, sentimos medo – mas seguimos em frente. Sempre firmes e cientes, e amparados em um companheirismo inabalável, indestrutível, reconfortante.
A maioria jamais entenderá, mas os que se rebelam só o fazem porque para eles não há alternativa a não ser se rebelar. Trata-se de uma convicção, muitas vezes incurável e que provavelmente carregaremos para sempre. Uma convicção que diz que em meio a tanta, mas a tanta injustiça, rebelar-se sempre valerá a pena. Sempre.